Como podemos encontrar calma quando nada parece sob controle
No consultório, ouço com frequência pessoas dizendo: “Eu nem sei por que estou tão ansiosa, parece que minha cabeça não para.” E essa frase carrega algo muito humano: o medo do incerto.
E esse medo não surge do nada. Muitas vezes, ele tem raízes profundas em experiências passadas, em padrões aprendidos na família, em um contexto que exige de nós mais certezas do que conseguimos ter. A ansiedade é, muitas vezes, uma resposta a um mundo que se move rápido demais para o ritmo que nosso corpo e nossa mente conseguem acompanhar.
Vivemos tempos em que quase nada parece previsível, e o cérebro que adora sentir que tem o controle, entra em alerta.
Mesmo quando o corpo tenta descansar, a mente continua trabalhando: “E se der errado?”, “E se eu não conseguir?”, “E se tudo mudar de novo?”.
A ansiedade costuma nascer justamente nesse espaço entre o que a gente quer garantir e o que não dá pra prever.
Quando o incerto vira gatilho
O cérebro tem uma função especial: ele quer nos proteger.
Para isso, tenta prever o que vem a seguir, porque prever é o que dá sensação de segurança.
Quando algo escapa desse controle, o corpo reage. O coração acelera, o peito aperta, o sono fica leve.
A verdade é que a ansiedade, na maioria das vezes, não é inimiga.
Ela é um pedido por segurança, um sinal de que algo dentro de nós está tentando se reorganizar.
Como o contexto relacional influencia a ansiedade
A ansiedade surge e se intensifica dentro de um contexto, e muitas vezes, esse contexto é relacional.
Expectativas familiares e sociais
Às vezes, a ansiedade se alimenta de falas que recebemos ao longo da vida: “você precisa ter sucesso”, “não pode falhar”, “tem que dar conta de tudo”. Essas expectativas, vindas da família, do trabalho ou da sociedade, criam uma pressão interna que se manifesta como ansiedade.
Padrões aprendidos no sistema familiar
Se você cresceu em um ambiente onde havia muita preocupação, vigilância constante ou medo do futuro, é natural que tenha desenvolvido uma tendência à ansiedade. Não como algo “errado” com você, mas como um padrão aprendido de estar no mundo.
Relações atuais
Relações atuais também impactam seus níveis de ansiedade. Relacionamentos em que você não se sente seguro para ser você mesmo, ambientes de trabalho excessivamente exigentes (que podem levar ao burnout), ou dinâmicas onde você assume responsabilidades que não são suas, tudo isso alimenta o ciclo da ansiedade e do estresse.
Entender esses contextos não é para culpar ninguém, mas para reconhecer que você não está ansioso “sem motivo”. Há razões, há história, há contexto.
O que (quase sempre) aumenta a ansiedade
Muita gente tenta lidar com a ansiedade de formas que, sem perceber, acabam ampliando o desconforto.
Por exemplo:
- Tentar “parar de pensar”, o que só aumenta a tensão.
- Se culpar por sentir ansiedade.
- Buscar mais e mais informação pra tentar “ter certeza” de tudo.
Essas tentativas vêm de um bom lugar, do desejo de se sentir no controle, mas acabam nos afastando do presente, onde a calma realmente acontece.
Três práticas que ajudam
Respirar com presença
Talvez soe simples demais, mas respirar conscientemente é um dos recursos mais potentes pra acalmar o corpo.
Tente inspirar devagar pelo nariz (4 segundos), segurar um pouquinho (2 segundos) e soltar o ar pela boca (6 segundos).
É um jeito gentil de avisar ao corpo: “agora está tudo bem.”
Colocar em palavras o que sente
Quando você nomeia “estou com medo”, “estou insegura”, “estou cansada”, a emoção deixa de ser um caos difuso e começa a ganhar forma.
Pode escrever, falar, ou simplesmente reconhecer mentalmente.
A clareza traz alívio.
Criar pequenas rotinas de previsibilidade
A ansiedade se alimenta do que é imprevisível.
Pequenas rotinas como acordar no mesmo horário, se alimentar bem, fazer uma pausa no meio do dia, ajudam o cérebro a entender que há estabilidade, mesmo quando o mundo lá fora está agitado.
Outras práticas simples incluem ouvir música que acalme, tomar um banho relaxante ou conversar com alguém de confiança. O importante é encontrar pequenos gestos que tragam sensação de segurança e presença.
Não é sobre ter o controle de tudo, mas sobre criar pequenos pontos de apoio no seu dia.
Questionar pensamentos ansiosos com gentileza
Quando a ansiedade aparece em forma de pensamento (“e se der tudo errado?”), em vez de tentar “parar de pensar”, experimente conversar gentilmente com esse pensamento:
“Esse pensamento é baseado em fatos ou em medo?”
“Qual seria uma alternativa mais realista?”
“O que eu diria para um amigo que estivesse pensando assim?”
Não se trata de “pensamento positivo” forçado, mas de trazer uma perspectiva mais equilibrada para a mente ansiosa.
Conectar-se com quem te traz segurança
A ansiedade pode nos fazer querer nos isolar, mas conexão genuína é um dos maiores antídotos para ela. Conversar com alguém de confiança, estar na presença de pessoas que te acolhem, ou até mesmo uma mensagem para alguém querido pode trazer alívio.
Lembre-se: você não precisa passar por isso sozinho. Permitir-se ser apoiado também é uma forma de cuidado.
O papel da terapia
Por que a terapia ajuda tanto com ansiedade?
Porque oferece algo que o mundo ansioso raramente oferece: tempo, espaço e escuta sem julgamento. Na terapia, você não precisa “estar bem” ou “ter respostas”. Pode simplesmente ser, com toda sua ansiedade, e começar a entender de onde ela vem e o que ela precisa de você.
Na prática clínica, percebo que a ansiedade costuma ter muitas camadas.
Pra algumas pessoas, vem do medo de errar; pra outras, da sensação de que o mundo é instável demais.
Na terapia, esse espaço vira um lugar seguro pra entender o que a ansiedade está tentando dizer e aprender a responder com acolhimento, não com cobrança.
Além disso, o acompanhamento profissional ajuda a identificar gatilhos específicos e oferece ferramentas personalizadas para cada pessoa, tornando o dia a dia mais leve e menos sobrecarregado.
Na abordagem sistêmica, olhamos também para o contexto em que sua ansiedade se manifesta. Como estão suas relações? Que papéis você assume que podem estar sobrecarregando você? Que expectativas estão pesando? Esse olhar ampliado ajuda a trabalhar não apenas os sintomas, mas as raízes relacionais da ansiedade.
A ideia não é “eliminar” a ansiedade, mas construir segurança interna, mesmo quando o cenário externo muda.
Para finalizar
Você não precisa controlar o futuro pra encontrar paz.
Às vezes, tudo o que o seu corpo precisa é de uma pausa, um respiro, um momento de presença.
A ansiedade não é sinal de fraqueza, é sinal de humanidade.
E se você percebe que sua ansiedade está conectada a padrões que se repetem, a relações que te sobrecarregam, ao estresse crônico ou até ao esgotamento emocional, ou a expectativas que não cabem mais em você, a terapia pode ser esse espaço onde você reconstrói uma relação mais gentil consigo mesmo e com o mundo ao seu redor.
E se estiver difícil lidar sozinho, a terapia pode ser esse espaço onde você aprende a se escutar, se acalmar e se acolher com mais gentileza.
Uma respiração de cada vez, é possível reencontrar o agora.
